Um levantamento técnico sobre a Moratória da Soja em Mato Grosso aponta que a maior parte dos imóveis identificados em desacordo com o pacto não tinha licença integral para desmatamento.
Dos 2.168 imóveis analisados na safra 2022/23, 77,5% não possuíam Autorização de Supressão de Vegetação (ASV) para as áreas convertidas em lavouras de soja. Outros 18,3% apresentavam sobreposição parcial entre as autorizações e o desmate, enquanto apenas 2,3% tinham coincidência total entre a supressão e o licenciamento registrado.
O estudo, encomendado pela Associação Brasileira das Indústrias de Óleos Vegetais (Abiove), avaliou exclusivamente os municípios de Mato Grosso incluídos no monitoramento da moratória e cruzou informações de sistemas federais e estaduais de licenciamento ambiental, cadastros de propriedades e registros de embargo. Entre as bases consultadas estão o Sistema Nacional de Cadastro Ambiental Rural (Sicar), o sistema estadual Simcar-MT, o Incra, além dos sistemas de licenciamento Sinaflor e Sema-MT.
Segundo os dados, a área de soja considerada em desacordo com a moratória no Estado soma 190,9 mil hectares, o equivalente a 1,6% da área plantada com o grão na safra 2022/23, estimada em 11,7 milhões de hectares. Dentro dos 5,1 milhões de hectares monitorados pelo pacto, 614,4 mil hectares estão em imóveis com algum ponto fora dos critérios definidos pelo acordo.
A análise não julgou a legalidade dos desmatamentos nem comparou a data das licenças com o momento da supressão. O objetivo foi medir a compatibilidade espacial entre os mapas de soja e os registros de ASV. O estudo também examinou embargos do Ibama: 73,2% dos imóveis não tinham sobreposição com áreas embargadas, e apenas 2,6% estavam totalmente sobrepostos a áreas sob embargo federal.
Sete municípios concentram quase metade da soja fora dos critérios do pacto: Feliz Natal (33 mil hectares), União do Sul, Nova Maringá, Cláudia, Santa Carmem, Nova Ubiratã e Porto dos Gaúchos. Nesses locais, predominou a ausência de licenças integrais, e só em 20 casos houve coincidência total entre desmate e autorização.
A Moratória da Soja é um pacto voluntário firmado em 2006 por empresas do setor agroindustrial, com apoio do governo federal e de organizações da sociedade civil. O acordo estabelece que signatárias não devem adquirir nem financiar soja cultivada em áreas do bioma Amazônia desmatadas após 22 de julho de 2008 — marco definido pelo Código Florestal (Lei nº 12.651/2012).
Segundo a abiove, o pacto contribui para a redução do desmatamento e auxilia o Brasil a atender exigências de mercados como a União Europeia. Já lideranças do setor contestam a moratória em ações judiciais e administrativas, argumentando que ela cria barreiras comerciais inclusive em áreas com desmatamento permitido por lei.
A pesquisa pedida pela Abiove reacende o debate em meio a disputas políticas e ações judiciais sobre a Moratória da Soja. No Supremo Tribunal Federal (STF), está parado o julgamento da ADI 7774, processo que questiona a lei estadual nº 12.709/2024, de Mato Grosso. Essa norma suspende incentivos fiscais a empresas que aderiram ao pacto.
O relator, ministro Flávio Dino, já se manifestou a favor do reconhecimento da moratória como um acordo legítimo da sociedade civil, mas defendeu que o Estado mantenha liberdade para definir sua política tributária. A análise foi interrompida depois de um pedido de vista do ministro Dias Toffoli.